O bebop era uma música brilhante, porém exigente
complicada, rápida e furiosa.
Melodias familiares e sons conjuntos não faziam parte dela.
Tudo dependia da inspiração
da habilidade e da sofisticação musical do solista..
Alguns ouvintes ficavam sinceramente espantados
Músicos mais jovens continuavam venerando
Charlie Parker e Dizzy Gillespie
mas alguns também começaram a buscar formas ...
de manter firmes as inovações do bebop
enquanto restauravam o equilíbrio entre os solistas e o grupo.
''O público pode ser fortalecido'', dizia o pianista,
arranjador e compositor John Lewis,
''se fortalecermos a nossa obra com estrutura.''
EPlSÓDlO DEZ
EPlSÓDlO DEZ lRRESlSTÍVEL
No outono de 1949, um fluxo constante de músicos
formava fila em frente a um prédio próximo a uma lavanderia chinesa
na Rua 55 Oeste, na cidade de Nova York
No seu porão ficava o apartamento de um quarto de Gil Evans
um brilhante arranjador freelance.
A porta dele ficava aberta vinte e quatro horas por dia
e entre os homens que passavam por lá para uma jam session
estavam alguns dos mais talentosos jazzistas
como Gerry Mulligan
Lee Konitz
e John Lewis.
O maior parceiro de Evans era o jovem trompetista Miles Davis
um inovador impaciente e incansável
que, nos vinte e cinco anos seguintes
forçaria continuamente as fronteiras do jazz.
Ele nasceu no leste de St. Louis, em lllinois, em 1926
filho de um conhecido dentista e fazendeiro.
O Dr. Davis criou o filho no tipo de isolamento confortável
que pouquíssimos jazzistas conheceram:
uma bela casa em um bairro de brancos
uma cozinheira uma empregada e uma fazenda de cento e vinte hectares
com cavalos para montar.
Na infância, Davis era pequeno e tímido.
E tão bonito que os colegas o chamavam de ''lindinho''...
só para que ficasse com vergonha.
Para ser aceito, ele adotou uma aspereza exacerbada
que jamais abandonaria.
Ele começou a tocar trompete aos treze anos de idade.
Aos 18, já era bom o bastante para tocar com
Charlie Parker e Dizzy Gillespie
quando os dois passaram por St. Louis.
Quando ouviu Charlie Parker pela primeira vez, Miles Davis disse:
''Eu decidi na mesma hora que deveria deixar St. Louis
para ir morar em Nova York''.
E, em pouco tempo, se viu tocando regularmente com seu ídolo.
Miles tinha 19 anos quando começou
a trabalhar com Charlie Parker
e tinha o emprego que todo trompetista almejava:
Tocar na banda de Parker.
E ele era diferente.
A maioria dos músicos sérios
reconheceu de imediato que ele tinha
um lirismo maravilhoso, incomum e tocava como ninguém.
Porém, ele teve de criar um estilo,
porque não tinha o virtuosismo de Dizzy Gillespie
Então, começou a criar um estilo
mais baseado em timbre e melodia.
Tocar pouquíssimas notas, mas as notas certas.
Criou uma noção de clima.
Davis tinha apenas vinte e três anos em 1949
quando começou a freqüentar o apartamento de Gill Evans.
Ele queria encontrar uma nova vitrine para o estilo distinto e introspectivo
que estava desenvolvendo.
Bem, Miles tinha de encontrar um som
um estilo que contivessem a delicadeza de sua natureza
Ele mantinha a aspereza cortante lá dentro.
Sua música não era chorosa nem fraca
Porém, tinha uma nova delicadeza.
Um sentimento que faz o romance aflorar
e o transmite às pessoas.
É um som bastante delicado para ser de um homem
Lester Young, antes dele, era assim.
Miles tem uma vulnerabilidade
e não teme partilhá-la com quem o ouve.
Quando ele permitiu que ela permeasse seu som
a música se tornou irresistível.
Davis e Evans formaram um grupo não-convencional de nove integrantes
que continha tuba e trompa.
Eles fizeram apenas duas apresentações
no entanto, uma grande gravadora a Capitol Records,
os convidou para entrar em estúdio e gravar vários dos seus arranjos.
A Capitol acabou lançando a música deles em um LP chamado:
''Birth of the Cool''.
''Bird e Diz eram ótimos, mas não eram doces'', recordou Davis.
''Nós mexíamos com o ouvido das pessoas de forma mais gentil,
deixamos a música mais popular.''
O ''Birth of the Cool eram vários músicos reunidos.
Um estilo suave, porém intenso.
São os melhores encontros que há
Uma suavidade intensa.
Uma intensidade suave, porém constante
lntensidade constante é igual a êxtase.
E o difícil é sustentar esta intensidade.
Era um tipo de som penetrante.
Era penetrante e suave ao mesmo tempo.
E o que me tocou foi a solidão da condição humana.
Por alguma razão, eu achava que os negros
captavam muito bem em sua música
essa solidão da condição humana
Não importa o quanto você anseie pela comunidade,
no final das contas, há a solidão, inescapável.
Para mim, este é o melhor jazz
quando se ouve um solista
principalmente em uma música lenta ou uma balada
Para mim, o melhor jazz sempre foi assim.
Assim como Sidney Bechet e Charlie Parker,
Miles Davis também foi para Paris, em 1949
''A viagem mudou para sempre a forma como eu enxergava as coisas'',
recordou Davis.
''Foi em Paris que eu compreendi que nem todos os brancos são iguais.''
Ele conheceu Picasso, freqüentou Cafés com Jean-Paul Sartre
teve um romance breve e impetuoso com Juliette Greco.
''Eu jamais tinha me sentido assim na vida'', ele comentou.
''Era a liberdade de ser tratado como um ser humano
como uma pessoa importante.''
Mas tal sentimento não durou muito tempo.
Acho que os demônios de Miles começaram em 1949
quando ele foi à França
e foi tratado com muita realeza.
Quando voltou, foi tratado como qualquer negro
um rapazinho de cor.
Ninguém sabia ao certo quais eram os demônios dele.
Ele cresceu em um mundo cuidadosamente isolado
aprendendo que era uma criatura privilegiada.
Ao mesmo tempo, você aprende que é muito frágil.
E que isso pode ser tirado de você a qualquer instante.
Mas você é um príncipe ou uma princesa neste mundo.
Acho que a combinação de intitular e...
de intolerar...
os ataques de intolerância e o preconceito de castas
libertaram algo muito venenoso.
E também uma necessidade de se construir
uma imagem dramática do que seria um negro de rua.
Sendo brilhante, e sendo Miles Davis
ele o fez de forma convincente, porém mortífera.
Algumas semanas depois de voltar da Europa
incapaz de se livrar da sensação de que seu lugar era em Paris
e não conseguindo encontrar trabalho,
Miles Davis também se voltou às drogas.
Primeiro, cheirou heroína.
Depois, passou a injetá-la nas veias.
Para sustentar seu vício, ou como ele dizia ''para alimentar a besta'',
ele roubou de amigos, penhorou sua trompa e chegou a se tornar cafetão.
Davis foi preso por porte de drogas em Los Angeles
mas conseguiu se livrar da acusação
Foi quando seu pai desesperado para que ele largasse o vício
mandou prendê-lo, na esperança de que ele se internasse em um hospital
para ser tratado.
Davis se recusou, xingou seu pai e voltou para as drogas.
Da mesma forma que Charlie Parker,
ele estava ganhando a reputação de pessoa não confiável.
''As pessoas começavam a me olhar de outra maneira,
como seu eu fosse sujo ou algo parecido'', disse ele.
''Olhavam para mim com pena e horror.
E ninguém me olhava desse jeito antes.''
Aqui estão eles. Este é Charlie Parker
Obrigado.
E o famoso Dizzy Gillespie
Em 1952, Charlie Parker e Dizzy Gillespie
que ainda adoravam tocar juntos, receberam prêmios
da Revista Downbeat no novo meio de comunicação, que era a televisão.
O melhor saxofonista contralto de 1951 .
Parabéns.
Obrigado.
Diz, isto é para você, da Downbeat
por ser um dos maiores trompetistas.
Parabéns, Diz, digo, Dizzy.
Estou sendo meio informal.
Vocês têm mais alguma coisa a dizer?
Earl, dizem que a música fala mais alto que palavras
Preferimos dar nossa opinião assim.
Acho que ninguém vai se importar, se quiserem.
Durante a transmissão ao vivo, o semblante de Parker
permaneceu impassivo.
Seus olhos ferozes e o movimento dos dedos nas teclas
eram os únicos sinais externos do esforço exigido
para obter uma música tão brilhante.
A influência do bebop parecia estar em toda parte
alterando o jazz de maneira que nem mesmo Parker e Gillespie
poderiam ter imaginado.
Bud Powell, um dos músicos mais influentes da era
levou todas as complexidades do bebop para o teclado do piano.
Certo pianista disse que Powell superava até mesmo Bird e Dizzy.
O bebop, em princípio, parecia impossível de cantar;
entretanto, Ella Fitzgerald, que começou sua carreira
gravando baladas populares, se envolveu por inteiro.
Ela disse: '' Os músicos do bebop têm mais a dizer do que qualquer outro
músico atual.'' E os músicos de bebop a adoravam também.
O pianista John Lewis também amava a música de Charlie Parker
mas detestava a influência prejudicial de sua libertinagem
e do uso de drogas.
Em 1952, ele e outros antigos membros da big band de bebop
de Dizzy Gillespie formaram um grupo
...o Modern Jazz Quartet.
O quarteto ensaiava meticulosamente,
costumava vestir smoking no palco
se recusava a brincar com o público,
preferia uma casa de shows silenciosa aos estridentes nightclubs.
''Muita gente pensa que os jazzistas são drogados''
disse o músico Milt Jackson.
'' Mas nós provamos que não é o caso.''
Assim como o seu ídolo, Duke Ellington,
John Lewis insistia parar que sua música sempre fosse apresentada
sempre, com dignidade.
''Eu sou um negro americano'', disse ele.
''Tenho orgulho disso e quero ressaltar esta posição.''
Como descreveria o jazz?
Bem, há todo tipo de definições.
mas, basicamente, o som é este.
Louis Armstrong!
Para muitos músicos do bebop, a música de Louis Armstrong
parecia irremediavelmente defasada.
Nossa, é isso mesmo, Louis.
Eu tenho um pedido.
Quero ouvir ''Whippenpoof Song''.
Quer ouvir uma das versões antigas de Birdland?
Quero.
O próprio Dizzy Gillespie chegou a dizer que ele era coisa do passado.
Mas o bebop tinha seus críticos também, e Louis Armstrong
em uma famosa participação no Hollywood Bowl
zombou da boina típica de Gillespie e da nova música
O bebop e a reação que ele causava abriram uma enorme divisão no jazz
politizando a música como nunca.
Tommy Dorsey denunciou Dizzy Gillespie e Charlie Parker
como ''comunistas musicais''.
Sidney Bechet disse que o bebop já estava tão morto
quanto Abraham Lincoln
Roy Eldridge foi mais prático e, talvez, mais honesto.
Ele disse: ''Os músicos do bebop são bons
no entanto fecham mais casas do que abrem.''
Meus amados súditos, trago-lhes notícias terríveis.
Terríveis!
De agora em diante, a música oficial
de Squarsedale é o bebop!
E com vocês, Sherwood Trio!
lsso realmente me irrita.
Bem, falando-se em Monk
ele é o meu músico favorito.
Ele é o mais antigo e sagaz sábio do mundo.
Mas parece que tem cinco anos.
Tem uma mente musical superior
em organizaçãoe lógica, é um matemático
Como todos os músicos de bebop,
qualquer jazzista, na minha opinião
os solos de Monk são os mais lógicos.
Obras-primas. Extremamente consistentes.
Um grande compositor que usava chapéus engraçados.
Monk tinha muita perspicácia.
Sua música é engraçada, mas extremamente sincopada.
Thelonious Monk, o professor de chapéu
que fazia coisas esquisitas ao piano.
Ele é capaz de tirar das teclas
coisas estranhas, depois olha para o que fez e diz: ''Está bom.''
Ele aproveita tremendamente
sua capacidade,e não hesita em dividi-la com você.
Nenhum homem tão misterioso jamais tocou jazz
como Thelonious Sphere Monk
E poucos criaram música mais memorável
Nascido na Carolina do Norte em 191 7
ele foi criado no West Side de Nova York
infiltrou na música gospel
como o acompanhante adolescente de um evangelista itinerante.
Em 1941 , ele tinha se tornado o pianista principal
da Minton's Playhouse
na época em que o bebop estava nascendo.
Thelonious Monk é um dos pianistas de jazz
que chegaram e encontraram as brechas
no meio da escala diatônica,
que é a base da música ocidental.
Para mim, Thelonious Monk se aprofundou nisso
e conseguiu transmitir
os menores intervalos existentes.
Ele era um grande homem reticente
que tocava com dedos esticados em um estilo percussivo único.
Os dedos eram tão esticados, nunca dobravam.
Estava acostumada com pianistas de belas mãos curvas
mas Thelonious fazia assim
e esperava um instante para tocar a nota.
Eu dizia: ''Nossa! Será que vai conseguir?''
E nunca era uma continuidade musical fluindo
e sim um dedilhar. Ele imaginava:
''Vou tocar aquela.''
E eu ficava sentada e dizia:
''No que vai dar? O que será...''
E sempre dava certo. Sempre acertava a nota.
No início, os ouvintes ocasionais percebiam as excentricidades de Monk.
Ele tinha sua própria maneira de se vestir.
Ele costumava passar dias sem falar com ninguém.
Ele usava os cotovelos para tocar notas de vez em quando
e algumas vezes se levantava no meio da música para dançar
em um êxtase aparente.
Cegos pelos seus modos esquisitos e desconcertados
pelos novos sons que fazia,
muitos críticos não conseguiram ouvir os ecos
dos músicos que ele mais admirava:
o mestre do Harlem, James P. Johnson, e sua maior influência...
Duke Ellington
Os críticos podem ser realmente obtusos.
Eles dizem que querem ouvir novidades,
mas elas os incomodam por não as poderem categorizar.
E Monk era muito criticado na ...
''Downbeat''e em outros jornais de jazz.
Prejudicava o trabalho dele.
Ele e Ellington são os maiores compositores
individuais que o jazz já teve.
Se Thelonious Monk tivesse uma personalidade diferente
a capacidade de organizar e conseguisse
manter a organização da mesma forma que
Duke Ellington conseguia,
teria sido bem mais famoso e sua música, bem mais conhecida.
Ele raramente tocava a música de Qualquer outra pessoa
e explicava que estava determinado a criar uma demanda própria.
Com o passar dos anos, muitas de suas melodias se tornaram padrão como:
''52nd Street Theme''
''Straight No Chaser''
e ''Round Midnight''.
Um clássico de Monk seria ''Epistrophy.''
Então, ele chega à segunda parte, e faz...
É o Monk, profundamente arraigado no blues.
Sentimental. Ele gostava muito de...
Semitons.
Ele dá e, depois, tira.
Depois, leva você até o extremo.
Deixa um espaço.
Dá a você de outra forma.
E volta ao tema original.
São os dois semitons.
O mesmo semitom.
É difícil descrever realmente,
porque Monk é lógico, belo e muito puro.
Em 1951 , a polícia de Nova York encontrou narcóticos em um carro
estacionado no qual ele e o pianista Bud Powell estavam sentados.
As drogas pertenciam a Powell
e, quando Monk se recusou a testemunhar contra o próprio amigo,
foi-lhe negada permissão para tocar em casas de espetáculos.
Ele não poderia se apresentar em nenhuma casa de Nova York
em que servissem bebidas alcoólicas.
Ele foi, de certa forma, banido,
tanto pela polícia, por não ter permissão
quanto pelos críticos. Os músicos sabiam
como ele era bom, mas isso não adiantava.
Monk se recusou a pensar em sair de Nova York.
Também não queria um emprego durante o dia
Ele ficou em casa, em seu movimentado apartamento
durante seis longos anos, debruçado sobre o teclado,
trabalhando na música que era a sua obsessão
Por fim, a Riverside Records lançou um disco dele
tocando composições próprias.
Desta vez, o crítico Nat Hentoff fez um comentário entusiástico
na revista ''Downbeat''.
Quando, finalmente, Monk conseguiu uma nova permissão
para se apresentar, levou um quarteto a uma casa de East Village
chamada Five Spot.
Grandes públicos o seguiram, subitamente ansiosos
para ouvir o homem que os críticos um dia desprezaram.
Os músicos formavam duas ou três fileiras no bar.
Nunca fui a Chicago ver Louis Armstrong
tocar com o Hot Five, mas devia ser comparável a isto.
Era simplesmente hilariante.
Você nunca sabia o que ia acontecer,
mas sabia que, o que fosse jamais aconteceria de novo,
e você se lembraria o resto da vida.
Monk não tinha mudado nada.
Ele continuava entrando em longos períodos de silêncio
continuava dançando no palco
continuava tocando melodias tão intrincadas
que um saxofonista recordou certa vez
que, quando os músicos se perdiam, era como cair em um poço
de elevador vazio.
Não importava mais.
Depois de quinze anos de obscuridade,
Thelonious Monk era, enfim considerado um gigante do jazz.
Sem dúvida, minha música favorita de Billie Holiday
é ''Autumn in New York.''
Quando a ouço cantá-la, quase choro.
É a versão mais linda de ''Autumn in New York.''
que já ouvi na vida.
''Disse à minha esposa: Quando eu morrer, quero que a toque.''
A versão dela é simplesmente linda.
Da mesma forma que Thelonious Monk,
Billie Holiday perdeu a permissão para se apresentar
por causa de uma prisão por narcóticos.
A maior parte dos anos 50, ela ficou impedida de cantar
nas casas da cidade de Nova York.
Entretanto, ela podia cantar em outras cidades e em palcos de shows.
Seu público aumentou
e, ano após ano, mesmo na era do bebop
os críticos a aclamaram como a maior vocalista de jazz.
Ela se esforçava e dava tudo de si.
Ela começava com a mão, com aquele dedo.
Quando cantava uma balada, você acompanhava
quase como se não tivesse de guiá-la,
só fazia algo ao fundo que achasse que ela iria gostar.
Se ela gostasse, se viraria e sorriria para você.
Ela se virava e sorria para mim, e aquilo me fazia sentir bem.
''Lady Day gostou.''
A voz dela havia diminuído,
mas não a ponto de impedi-la de cantar.
Ela tinha vivido de sua voz e a experimentado tanto,
que, àquela altura, suas limitações acabaram
por torná-la o maior tipo de virtuose.
Centenas de milhares de americanos se mudaram para a Califórnia
depois da guerra,
ansiosos por começar uma vida nova
em uma nova terra de oportunidades.
Eles também encontrariam uma nova variação do jazz.
Não muito tempo depois de o saxofonista barítono Gerry Mulligan
tocar as sessions de ''Birth of the Cool'' com Miles Davis,
ele conseguiu tocar regularmente às noites de segunda-feira no Haig
um pequeno nightclub na Wilshire Boulevard, Los Angeles.
Ele formou um quarteto com Chet Baker no trompete,
Chico Hamilton na bateria e Bob Whitlock no baixo.
A banda era tão serena que parecia o Oceano Pacífico.
As ondas, o ar varrendo a Costa Oeste,
e os jovens adoravam.
Tornou-se muito popular nos campi.
A revista ''Time'' fez uma matéria a respeito
e surgiu o movimento ''Cool Jazz'', ''West Coast Jazz.''
O mais conhecido grupo da Costa Oeste
era o quarteto liderado por Dave Brubeck.
Ele já tinha liderado uma banda no exército durante a 2ª Guerra Mundial
depois voltou para a escola, para estudar música
com o compositor francês Darius Milhaud.
Darius Milhaud disse:
''Viaje pelo mundo e mantenha os ouvidos abertos.
Use tudo o que ouvir de outras culturas,
traduza para o idioma do jazz.''
Quando fui à Turquia e ouvi os músicos
tocando este ritmo,
perguntei que ritmo era.
Um-dois, um-dois, um-dois, um-dois-três.
Antes de eu terminar o compasso, eles fazem...
Tocam 9/8, improvisando, como um blues americano
E pensei: ''Nossa! Um grupo improvisando em 9?
Por que não aprendo também?''
A carreira de Brubeck por muito pouco não terminou em 1951
quando ele feriu gravemente o pescoço em um acidente de mergulho.
A partir daquele momento, ele teve de mudar o estilo do seu teclado
usando acordes em bloco, em vez de passagens de uma nota só.
Tal estilo seria complementado com perfeição pelo desempenho
do saxofonista contralto Paul Desmond
leve, lírico e romântico.
Como o próprio Desmond disse ...
era como o som de um martíni seco.
Paul fazia um som adorável no contralto.
Por exemplo, ele estava apaixonado por Audrey Hepburn,
Não que nada tivesse acontecido.
Mas a música dele era como quando ela aparecia na tela.
Havia leveza, porém substância ao fundo.
Realmente muito lírica.
Um homem tornava o outro melhor.
Eu queria fazer um álbum chamado ''Time Out.''
Passaríamos por várias marcas de tempo
que não eram usadas no jazz, como...
Um-dois, um-dois, um-dois-três,
um-dois, um-dois,. um-dois, um-dois-três
Pedi a Paul que fizesse algo em cinco.
No ensaio seguinte, Desmond
acrescentou diversas melodias originais.
Eu olhei para ele e disse:
''Paul, se pegar o primeiro tema'', que era...
''e começar pela segunda parte, em vez de...''
''Vamos usá-la primeiro,
repeti-la e usar o primeiro tema como nova 2a. parte.''
E assim nasceu ''Take Five.''
Quando Brubeck lançou o álbum ''Time Out''
vendeu mais de um milhão de cópias, um feito jamais conquistado
por qualquer outro LP de jazz até então.
Fãs negros e brancos seguiam o quarteto de Brubeck.
Foi considerado o grupo favorito dos leitores do ''Pittsburgh Courier''.
E Brubeck nunca esqueceu que, Quando Willie the Lion Smith
ouviu um de seus discos sem que lhe dissessem quem estava tocando,
ele disse: ''Ele toca como a origem do blues''.
Ninguém entendeu melhor que o próprio Dave Brubeck
o quanto devia a gerações mais antigas de músicos negros.
Em novembro de 1954, ele estava em uma turnê com Duke Ellington
um homem a quem considerava o maior dos compositores americanos
-além de amigo -
Quando a foto de Brubeck apareceu na capa da revista ''Time''.
Bateram à porta do meu quarto de hotel às 7 da manhã.
Era Duke, e ele disse:
''Dave, está na capa da 'Time''.
Eu fiquei arrasado, porque queria sair na capa
depois de Duke, e não antes,
pois estavam fazendo matérias sobre nós dois.
A pior coisa que poderia me acontecer seria
sair na capa antes de Duke.
E ele me entregou a revista: ''Tome.''
O FUTURO NÃO-VlVlDO
''Charlie Parker morreu lentamente, como um homem se desmembrando
com uma lâmina cega em um palco iluminado
Seu público reagiu como se ele estivesse fazendo o mesmo que
saxofonistas que grasnam e rolam no chão.
No final, ele não tinha mais privacidade.
Seus momentos mais trágicos foram privados de significância humana.''
Ralph Ellison.
Se você vai morrer aos 34 anos
certamente não sabe que vai morrer nessa idade
pode achar que chegará aos 70 anos como diz a Bíblia.
Então, o final da carreira de Bird
Não é só o fim de um curto trajeto
é uma análise do futuro não vivido.
Ele fica determinado a criar uma nova revelação
na música com a magnitude de seu sucesso com o bebop.
Ele está nessa busca, e vai bem.
De repente, puxam o tapete sob seus pés.
Em março de 1954, Charlie Parker estava tocando
no Oasis Club em Hollywood.
Estava temporariamente sem usar drogas; no entanto, estava inchado
cronicamente confuso.
A saúde estava prejudicada devido às enormes quantidades de bebida
alcoólica que ele andava consumindo.
Então, ele recebeu um telegrama de Chan, de Nova York.
Pree, a filha deles de dois anos de idade, tinha morrido de pneumonia.
Desde que Pree nasceu, estava sempre doente.
Nenhum médico descobria por quê.
Eu fui a um cardiologista infantil
e ele descobriu que ela tinha uma falha no coração
lsso foi antes de operar o coração.
Na noite em que recebeu a notícia, Parker enviou quatro telegramas
de Los Angeles para Chan,
um mais incoerente que o outro.
''Minha querida,
a morte de minha filha me surpreendeu mais que a você.
Não encerre os procedimentos para o enterro até eu chegar.
Serei o primeiro a entrar em nossa capela.
Perdoe-me por não estar ao seu lado no hospital.
Com amor, seu marido, Charlie Parker.''
''Minha querida, pelo amor de Deus,
mantenha-se calma. Charlie Parker.''
''Chan, socorro. Charlie Parker.''
''Minha filha está morta. Eu sei.
Estarei aí o mais rápido possível.
Meu nome é Bird.
É muito bom estar aqui.
As pessoas têm sido muito boas comigo.
Eu irei imediatamente.
Fique calma.
Deixe que eu seja o primeiro a chegar perto de você.
Sou seu marido.
Com amor, Charlie Parker.''
Foi terrível receber aqueles telegramas.
Eu estava em estado de choque.
Estavam me dando tranqüilizantes.
Eu não largava o roupão que ela usou para ir para o hospital
e, a cada hora, chegava um novo telegrama!
Foi horrível para mim. Horrível.
Sei que Bird não se deu conta.
Estava passando pelo próprio inferno.
Ele conseguiu passar pelo enterro, mas já não conseguia mais se conter.
Um compromisso com uma seção de. cordas em Birdland
terminou em desastre, quando ele bebeu demais
e tentou despedir a banda
Em vez disso, o gerente o despediu.
Ele foi para casa e brigou com Chan. Tentou se matar engolindo iodo.
Médicos de uma ambulância o salvaram.
O problema com a bebida ficou pior.
Ele começou a andar de metrô a noite inteira.
Ele parecia assustado. Em estado de pânico, como ele dizia.
Suspeitava até de seus admiradores.
Ele comentou com um amigo: ''Eles só vieram para ver
o viciado mais famoso do mundo.''
Certa noite, ele foi até um bar em Nova York,
onde seu velho amigo Dizzy Gillespie estava vendo uma banda.
Parker estava amarrotado, gordo e desorientado.
Ele ficou repetindo: ''Por que não me salva, Diz?
Por que não me salva?''
''Eu não sabia o que fazer'', recordou- se Dizzy Gillespie.
''Eu não sabia o que dizer.''
Parker cambaleou de volta para a rua.
Tenho certeza de que várias vezes
ele tentou se recompor, mas a bebida não ajudava.
Eu tinha alugado um saxofone e o usado.
Uma noite, eu estava entrando em um táxi
tinha bebido muito e Bird estava me ajudando
a entrar com outras pessoas.
Ele disse: ''Me deixe segurar isto.''
Pegou o saxofone. Claro que, 2 ou 3 dias depois,
quando o vi, não o tinha mais.
Estava em uma loja de penhora.
Fiquei um pouco bravo com ele.
Eu ia tocar no Open Door naquele domingo,
e ele apareceu para me ver tocar.
Eu me recordo daquela noite.
Ele se ofereceu para me deixar em casa depois
e eu disse: ''Não precisa. Eu pego um táxi.''
Porque eu ainda estava bravo com ele.
No dia 9 de março de 1955, Parker deveria pegar o trem para Boston
para uma apresentação.
No caminho, ele parou no Hotel Stanhope , na Quinta Avenida.
Era a casa de sua amiga, a Baronesa Pannonica de Koenigswarter
membro da família Rothschild e uma generosa incentivadora do jazz.
Parker estava claramente doente, e ela chamou um médico.
Ela chamou um médico, e ele disse:
''Este homem precisa ser internado.''
Bird se recusou a ir para o hospital.
Acho que ele se entregou.
O coração dele se entregou.
Acho que a vida foi pesada demais para ele.
Parker concordou em ficar com a Baronesa até se sentir melhor.
Três dias depois, no sábado,
Charlie Parker apareceu no programa de variedades Dorsey Brothers.
Ele sempre gostou do saxofone de Jimmy Dorsey.
O primeiro a se apresentar foi um malabarista.
Parker riu, ficou sufocado ...
e tombou.
Quando o médico chegou lá, ele já estava morto.
A causa oficial da morte foi pneumonia,
complicada pela cirrose hepática.
Mas ele tinha simplesmente se extinguido.
O legista estimou sua idade entre cinqüenta e cinco e sessenta anos.
Na verdade, ele tinha apenas trinta e quatro.
Eu comprei um ''New York Post,''
sentei no ônibus e rodei vários quarteirões
antes de abri-lo.
Quando abri o jornal e olhei,
vi a matéria que dizia que Bird estava morto
que tinha falecido na casa da Baronesa.
Foi terrível, sabe? Foi, sim. Foi terrível.
Eu me senti especialmente mal, porque
o tinha visto duas ou três noites antes
no Open Door,
e estava bravo por causa do saxofone.
Perdi a chance de ter mais um momento com ele.
Todos ficaram arrasados quando Bird morreu.
Eu não fui ao enterro.
Simplesmente, não consegui.
Não conseguia participar daquilo.
Quando Parker foi enterrado em sua cidade natal, Kansas City
a mãe dele ordenou que não se tocasse jazz durante o serviço fúnebre
Àquela altura, os mais ávidos Seguidores dele já tinham coberto
muros de Greenwich Village com a frase
''Bird vive''.
Acho que o verdadeiro legado de Charlie Parker
é a humanidade incorrupta de sua música,
por isso ela continua viva.
Pode analisá-la o quanto quiser
mas são a beleza, a perfeição, a recusa em fazer concessões
que nos comovem,
e vão continuar comovendo.
Sugar Ray Robinson, campeão de boxe na categoria de peso médio
era o herói de Miles Davis
Davis admirava a elegância com que ele despachava os adversários,
admirava as roupas de Robinson, sua bela aparência,
e as mulheres,que sempre pareciam se jogar em seus braços.
''Quando ele entrava no ringue''. recorda-se Davis,
''jamais sorria
era puramente negócios.''
lnspirado na seriedade de Robinson por seu ofício,
e cansado da vida que o seu vício o obrigava a levar
Davis resolveu deixar as drogas em 1954.
Como todos, decidiu fazê-lo sozinho.
Ele tinha acabado de sair de um compromisso com Max Roach
em Hollywood, pegou um ônibus e cruzou metade do continente
até a fazenda de seu pai no Leste de St. Louis.
Seu pai disse que a única coisa que poderia fazer por ele
era oferecer seu amor.
Ele disse: ''O resto você deve conseguir sozinho.''
Davis conseguiu.
Ele se mudou para um apartamento de dois quartos no segundo andar
da casa de hóspedes do pai e trancou a porta
Durante sete dias, quando o desejo pelas drogas urgia,
ele não comeu nem bebeu, tremendo de frio
e lutando para não berrar com a dor que torturava suas juntas.
''Então'', lembrou-se ele, ''um dia, tudo acabou.
Sem mais nem menos.
Eu saí para sentir o ar limpo e doce da casa de meu pai.
Quando ele me viu, tinha um enorme sorriso no rosto.
Nós nos abraçamos e choramos.''
''Tudo em que eu pensava'' recordou-se Miles Davis,
''era tocar música e recuperar todo o tempo
que eu tinha perdido''. �